terça-feira, 4 de setembro de 2007

O amor platônico, aquele não-realizado, o idealizado e sonhado, é uma coisa tão idiota

As pessoas sofrem à toa, tentam disfarçar seus sentimentos, com medo da rejeição do outro amado.
Eu odeio isso.
O mundo seria tão mais simples se um se declarasse ao outro sem compromisso, sem medo.
Imagino quantos pares já não existiram nesse mundo em que um amava platonicamente e outra era a amada sem saber que era.
João e Teresa eram amigos - João era loucamente apaixonado por Teresa, mas achava que ela, por ser tão bonita, inteligente e ousada no seu vocabulário, nunca se interessaria por um João tão comum, tão moreno de olhos castanhos e tão balconista de lanchonete.
Por isso , João , sempre que via Teresa, ficava com um nó na garganta. Um nó formado por frases não-ditas, filhas do Receio e da Insegurança.
Quantas vezes Teresa não chegava linda, sexy e poderosa à sua frente, com seu sorriso atrevido e ao mesmo tempo tão doce, e João deixava escapar o momento de dizer "Caramba, mas você está maravilhosa hoje".
Afinal, por que Teresa ia gostar de um elogio vindo de alguém tão desprezível?
Era bem capaz dela começar a odiá-lo por ofendê-la com tal abordagem constrangedora.
Quantas vezes João , encantado com as coisas que Teresa lhe dizia, não morria de vontade de segurar a moça e dizer , num tom de voz dos mais confiantes: "Teresa , não dá mais.
Você é linda, você é inteligente, você me faz rir, você é minha amiga.
Fica comigo , Teresa. Eu quero te beijar, eu quero você, entendeu?
Se você não quiser ficar comigo, eu terei de lidar com isso, mas Teresa, é você quem eu quero".
Mas João não disse.
João, ao invés disso, deu um sorriso quadrado e burro para Teresa, fez uma cara de bobo conformista e pensou "ufa, não fiz besteira".
E ficou ouvindo as peripécias de Teresa, vendo-a tomar seu cappucino de forma tão despreocupada, admirando cada detalhe dela em silêncio.
Naquele dia, Teresa, mesmo com toda sua beleza e encantamento, chegou em casa, ouviu "Oh! Darling" dos Beatles , ficou duvidosa e pensou em João.
E irritou-se por não saber mais o que fazer para agradá-lo.
Ela se arrumava, tentava ser o mais bela possível, a mais inteligente, fazia mil tiradas irônicas e puxava todas as sacadas de sua manga , mas João mostrava-se indiferente, ao que parecia. Por que ele era assim?
Ele que tinha toda uma beleza selvagem dentro dele, e não a percebia.
Ela tinha certeza daquilo, tinha certeza de que se tirasse aquele boné com a logomarca e a camisa polo, e lhe dessem um banho de loja, e uma dose de auto-estima, ele seria um dos caras mais sedutores já vistos.
Ele que tinha um sorriso malandro e ingênuo.
Ele que não fazia pose como os demais.
Ele.
Ele daquele jeito mesmo era tão encantador.
Talvez ele tivesse consciência de sua beleza agridoce e de seus maus modos incrivelmente irresistíveis, e por isso a tratava apenas como uma irmã mais nova.
Talvez ele queria mais do que ela podia oferecer.
Mas ela se esforçava tanto!
E naquele dia ela ainda havia colocado seu vestido mais atraente , e estava impecável!
E João não disse nada.
Ele deveria ser um grosso, um desses rudes que gostam dessas comuns por aí, dessas comuns de gosto-comum e senso-comum .
Ou então ele era gay, vai saber.
Teresa, então , desligou o cd player e esqueceu João.
Essa tarde mesmo ela passou em frente à lanchonete de mãos dadas com um outro alguém.
O nó na garganta de João nunca havia sido tão grande, até hoje.

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